quinta-feira, 7 de maio de 2015

Mulher quer se sentir especial mesmo no sexo casual, diz Mirian Goldenberg

Antropóloga estreia como romancista no livro “SeXo”, que usa personagem para mostrar como a mulher ainda se sente fracassada se o homem não liga depois de um encontro rápido

No celular, nenhuma mensagem. O mesmo vale para as redes sociais e e-mail. Depois de uma noite aparentemente perfeita, a narradora de “SeXo” (Editora Record), primeiro romance da antropóloga Mirian Goldenberg, se vê desiludida e perdida em uma espiral de culpa e frustração: “Onde foi que eu errei?”.


A antropóloga da UFRJ Mirian Goldenberg está estreando como romancista no livro
Divulgação
A antropóloga da UFRJ Mirian Goldenberg está estreando como romancista no livro "Sexo"

O enredo soa familiar para muitas mulheres, que não conseguem ficar plenamente satisfeitas com uma noite de sexo casual. Ao contrário dos homens, que parecem ter vindo de fábrica com o chip que permite aproveitar ao máximo e sem drama esses encontros furtivos. 
“Para eles, é apenas sexo, é bom e ponto final, ainda que por uma noite. Elas, no entanto, precisam se sentir especiais”, avalia Mirian, que conversou com mais de 5 mil mulheres e homens, nos últimos 25 anos de estudo e observação.
Para antropóloga que tem mais de uma dezena de livros publicados, a aceitação feminina do sexual casual pode mudar.  “A única forma de as pessoas superarem essa sensação de fracasso é sabendo que outras mulheres vivem isso. Tanto é que recebo muitas mensagens de mulheres que se dizem aliviadas por saber que não estão sozinhas”. Na entrevista, que você lê a seguir, Mirian fala mais sobre o tema. 
Delas: Como foi o processo de criação do livro, você se baseou em pesquisas?       
Mirian Goldenberg: Entrevistei muitas mulheres para dar origem à personagem, nos últimos dois anos. Ela não é apenas uma mulher, ela é todas do mundo. Entrevistei muitos homens também. Existem algumas partes do livro que são os homens que estão falando, na verdade. De uma forma geral, ajudou a sintetizar o que muitas mulheres já sofreram e ainda sofrem com relação às expectativas do sexo sexual. É um livro de ficção, mas que é verdadeiro, absolutamente. Eu não encontro mulheres que vivem o sexo casual da mesma forma que os homens. Pode ser que tenha por aí, mas eu não encontrei.
Delas: Qual o dado mais marcante que a pesquisa revelou?     
Mirian: Eu pesquiso homens e mulheres há pelo menos 25 anos. Percebi que esse tema do sexo casual, e da relação do sexo com romance, são temas recorrentes. A mulher tem uma expectativa romântica maior. A expectativa maior é que ela não quer ser como todas as outras - ela quer ser especial, única. Essa vontade é maior do que a expectativa de um romance, em si. Então, essa expectativa de ser única e diferente, e não uma qualquer, é presente não só na minha personagem, mas em quase todas as mulheres com quem conversei.  
Delas: A mulher ainda tem dificuldade para viver o sexo sem compromisso?
Miriam: Acho que a grande diferença entre homens e mulheres é com relação ao que vem depois. O tipo de reconhecimento para o qual o homem não está nem aí, mas que para a mulher tem um peso muito grande. Isso faz com que elas se entreguem menos, na primeira noite, tenham mais receios e dificuldade com o próprio prazer. Para eles, é uma visão mais pragmática, acabou e ponto final. Para a mulher existe a vírgula.
Delas: Por que existe essa dificuldade? É da natureza das mulheres ou é algo que pode mudar com o tempo?             
Mirian: Não existe, para mim, natureza. O que existe, obviamente, são as construções sociais. Em outras culturas, nada disso acontece. Na Suécia, a mulher age de um jeito diferente e é muito mais desapegada do sexo casual e suas complicações. Na Alemanha também, elas não estão nem aí para o que o cara está pensando.
Essa expectativa é uma coisa muito brasileira. Então, não sei se vai mudar, porque as questões culturais não mudam tão rapidamente. É algo que leva tempo. Isso a gente a gente pode observar nas novelas, nos romances, nas meninas que ainda seguem estereótipos de gênero.
Delas: Elas sempre se sentem culpadas porque o homem não liga no dia seguinte?
Mirian: A palavra não é nem culpada. Tem um momento em que ela percebe que não é culpada do “fracasso”. O que acontece é ela ficar achando que errou em algum lugar, e que se não tivesse errado tudo estaria bem. A realidade é que não existe essa a possibilidade de você acertar em tudo e do cara ligar no dia seguinte. Pode ser que ele tenha adorado a noite, e mesmo assim não vai te ligar. Existem outros motivos além do simples fracasso ou do erro, como um compromisso, trabalho, outra mulher, uma fase ruim e por aí vai. E nada disso tem a ver com a mulher com quem ele transou uma noite. Não tem nada a ver com o fracasso dela, porque ele não teria ligado de qualquer jeito, mesmo que tivesse sido a melhor noite do mundo.
Delas: Quais são as principais aflições e angústias da mulher moderna neste tema? 
Mirian: O medo de ter errado e não saber onde é algo muito presente. A comparação com outras mulheres também. Ela fica pensando que o cara pode ter achado ela velha ou gorda demais, e que outras mulheres teriam um resultado diferente. Além disso, existe aquela angústia de não saber o que fazer depois do sexo. Deve ligar ou não? Enfim, é muita coisa ao mesmo tempo, como a sensação de inadequação, fracasso e vergonha.          

Depois do sexo, catar a roupa e sair correndo só se o encontro tiver sido absolutamente desastroso. Foto: Thinkstock/Getty Images
Perguntar sobre fotos, ir abrindo a porta da geladeira ou, então, atender o telefone do outro, nem pensar. Foto: Thinkstock Photos
Despachar o outro num táxi: se você pegou o parceiro em casa com seu carro, tem que levá-lo de volta. Foto: Thinkstock/Getty Images
Tratar o parceiro como objeto: ligar para o outro no meio da noite, pois não encontrou nada melhor na balada, é falta grave. Foto: Thinkstock Photos
Dar sermões sobre comprometimento: avisar o outro para “não se apaixonar”, pode ser broxante. Foto: Thinkstock Photos
Falar sobre problemas sentimentais na cama, com alguém com quem você não tem compromisso, é forçar demais a intimidade. Foto: Thinkstock/Getty Images
Não usar camisinha: esse é o pior erro. Além de uma gravidez indesejada, pode-se contrair uma enorme variedade de DSTs. Foto: Thinkstock/Getty Images
Não checar referências: como o próprio nome já diz, sexo casual acontece sem muito planejamento, mas é sempre aconselhável saber com quem você está . Foto: Thinkstock/Getty Images
Sair divulgando a aventura na internet é gafe, pois pode dar a entender que está querendo exibir a conquista. Foto: Thinkstock/Getty Images
Fazer sexo casual, só porque para aquela sua amiga foi ótimo, é uma furada. Foto: Thinkstock/Getty Images
Depois do sexo, catar a roupa e sair correndo só se o encontro tiver sido absolutamente desastroso. Foto: Thinkstock/Getty Images
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Delas: Por que é mais fácil para os homens ter prazer com a relação casual?Mirian: A maioria das mulheres com quem eu conversei não consegue ter o orgasmo na relação casual. O homem tem menos expectativas e ele é educado e socializado diferente. Ele vive o sexo com esse objetivo desde muito cedo, sem dramatizar a situação. Para ele é sexo, é bom e ponto final. Não existem tantas fantasias. Ele aprendeu que é assim que deve ser a relação. Desse jeito, é muito mais fácil conseguir sentir prazer.
Delas: É inevitável para as mulheres esperarem que a noite de sexo casual se transforme, de alguma maneira, em um relacionamento mais profundo?            
Mirian: Não é isso. Elas também fazem sexo casual, achando que vai ser só aquela noite. A expectativa não é de que se transforme numa relação, mas que com elas tenha sido diferente, que exista essa ideia de que elas foram especiais. Mesmo que não exista a vontade do compromisso. O homem pode demonstrar esse desejo, e a mulher não querer nada. Mas ela vai se sentir bem porque foi especial.

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